Tentando compreender e ser compreendido
Este texto aborda temas sensíveis como racismo, insegurança emocional e medo de julgamento. Pode conter gatilhos para algumas pessoas.
🤔🎤
Em amarelo está o que eu falei, em verde o que Consciente falou.
Hoje, participei de uma conversa em um grupo para pessoas autistas. Questionei uma fala de uma mulher da seguinte maneira:
"É possível ser bipolar e capacitista em relação à bipolaridade?"
No decorrer da conversa, uma mulher que chamarei de Consciente comentou:
"Claro, assim como dá para ser negro e ser racista. Fazer parte de uma comunidade não te isenta de ser preconceituoso."
Respondi:
"Mas a pessoa negra é vítima do racismo. Ela pode reproduzir discursos racistas porque foi vítima desse sistema, mas não sei se dá para chamá-la de racista. Acho que dá para dizer que é preconceituosa, mas prefiro não usar o termo 'racista'. Para mim, ela continua sendo mais uma vítima do racismo."
Então, Consciente respondeu:
"Vítimas que propagam opressão também são opressoras, é o que é. Não adianta passar açúcar por cima."
Essa fala me soou como um "Para de passar pano para racistas!".
"Não adianta passar açúcar por cima."
Essa frase ressou em minha cabeça!
"Não adianta passar açúcar por cima."
A interrompi com a frase:
"Não estou passando."
Ela então completou:
"O motivo por trás pode ser outro, mas não tira a responsabilidade."
Respondi:
"Em momento algum eu disse que deveria tirar."
Foi quando encontrei e compartilhei este artigo - Racismo é sobre dominação e poder, logo o negro não tem como ser racista
Percebi que estava insistindo muito no mesmo ponto e escrevi:
"Eu tenho rigidez cognitiva e só me sinto em paz quando tenho certeza de que fui plenamente compreendido. Mas não precisam concordar. Vou escrever aqui exatamente o que passou na minha cabeça."
Expliquei então:
*"Eu disse que não existia racismo quando uma pessoa negra oprime outra por sua cor de pele, porque ambas são vítimas do racismo estrutural. Argumentaram que ainda assim era racismo, pois, apesar de ambas serem vítimas, uma ainda oprime a outra, e que eu estaria passando pano.
Isso me fez repensar. Fui pesquisar, porque 'passar pano' é algo muito sério. Encontrei um artigo que corroborou meu posicionamento: 'O racismo é uma ideologia de dominação. Só é racista quem tem poder ou privilégio na sociedade.'"*
E para deixar bem claro, um resumão (kkkkkk):
"No âmbito legal, é correto recorrer ao crime de racismo e denunciar essas situações como tal. Mas, no campo das ideias, é importante reconhecer que essa pessoa também é vítima."
Me senti atacado pela Consciente e não sei se esse sentimento é coerente. Após toda essa explicação, acabei me estendendo mais um pouco, porque não queria, de forma alguma, ser excluído, julgado, tratado como pária ou, pior, visto como racista.
Continuei explicando minha insistência no assunto:
*"Ainda estou formando minha opinião sobre isso. Estava pesquisando para entender melhor o que dizem a respeito e perguntando opiniões. Não quero estar passando pano sem perceber.
Eu tento ser a melhor pessoa possível, mas me dá muito medo de estar sendo ruim e nem perceber. Muito medo. Porque, além de prejudicar um ideal, eu afastaria as pessoas de mim.
Não quero ser uma pessoa ruim, mas tenho medo de ser e não perceber. Às vezes, expresso uma opinião e magoo alguém sem intenção.
Por isso, insisto tanto em alguns assuntos: para ter certeza de que fui compreendido ou de que não falei besteira. Mas, além disso, também tenho muito medo de estar sendo racista, por exemplo, sem perceber. Ou de reproduzir qualquer outro tipo de preconceito.
Imagina só... eu reproduzindo um preconceito sem nem notar? Não quero ser esse tipo de pessoa.
Enfim... sou um pouco doidinho."*
Eles entenderam, mas Consciente voltou para dizer algo que eu não queria ouvir:
"Você já assistiu ao filme ‘Get Out’? Em português, se chama ‘Corra!’. No filme, há uma moça extremamente insistente em provar que não é racista. Ela toma as dores de todo mundo, chega a ser inconveniente e teimosa com autoridades só para reafirmar seu ponto. O problema é que, ao agir assim, ela acaba passando a impressão de que está tentando se provar demais, exagerando ou escondendo algo. Não estou dizendo que essa seja a sua situação, mas esse é o risco que você corre ao se preocupar tanto."
Ela continuou:
"A verdade é que, a todo momento, corremos o risco de ferir os sentimentos de alguém com nossas opiniões. Mas existe uma diferença entre opinião e discurso de ódio. Por exemplo, não se opina sobre o corpo, a religião ou a sexualidade de alguém. Mas é possível opinar sobre religião de forma geral, desde que faça sentido. Não se opina contra fatos, mas se opina contra opiniões. Precisamos, sim, ser empáticos e cuidadosos, mas chega um momento em que os sentimentos alheios deixam de ser nossa responsabilidade. Agora, imagine ter que pisar em ovos o tempo todo por medo de magoar alguém. Não é assim que se vive."
Novamente, me senti atacado e comecei a me questionar: será que sou realmente esse tipo de pessoa? Tive medo de ser. Fiquei inseguro, achando que poderia estar sendo egoísta, mas não estou. Eu realmente me importo com os outros.
MAS É FATO! Também me preocupo muito com a minha imagem.
Confesso que achei ela chata. Sempre sou eu quem precisa recuar e refletir sobre o que disse, mas por que mais ninguém faz isso? No outro grupo, também tinha pessoas assim. Elas não necessariamente falavam coisas erradas, mas tinham opiniões tão seguras, nunca recuavam, nunca refletiam uma segunda vez. Quando sou apenas eu quem aceita opiniões contrárias, parece que vira opressão. Eu ouço, mas não falo! Se falo, estou errado, apenas.
Senti como se ela me achasse falso. Consciente falou de forma direta e áspera, sem levar em consideração minhas emoções. Isso me fez achar que estava fazendo algo errado e sendo tratado secamente, porque não merecia cuidado com as palavras. Ela ainda comparou minha situação com uma personagem negativa de filme, deu a entender que eu estava "passando pano" e opinando contra fatos.
Poxa, quando é o contrário, tento ser muito cuidadoso.
Eu esperava que fossem compreensíveis com minha insegurança, mas pelo que eu entendi, posso ser incoveniente.
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